Para a maioria das pessoas, a Heráldica é uma coisa do passado, estranha e anacrónica, medieval e ultrapassada. Mas o que é certo é que continuamos rodeados de motivos e símbolos heráldicos, muito mais, porventura, do que pareceria à primeira vista.

Desde logo, a Heráldica de Domínio mantém-se viva por toda a parte, e até a mais pequena freguesia exibe com orgulho o seu brasão.

Brasão da freguesia de Santo António de Alcórrego, Avis

Mas a Heráldica de Família, embora oficialmente abolida em Portugal com a revolução republicana de 1910, também ainda aparece, por vezes onde menos se espera. É frequente vermos brasões de família ou de títulos nos rótulos de algumas garrafas de vinho, talvez porque, subconscientemente, associamos os brasões a grandes solares e casas senhoriais, onde em extensos vinhedos e caves vetustas se produz vinho de alta qualidade como se fazia antigamente...

Rótulo de garrafa de vinho tinto alentejano "Marquês de Borba"

Mais subtilmente, e por vezes com menor correcção heráldica, encontramos vestígios de brasões nos emblemas das associações desportivas, e muito particularmente dos mais conhecidos clubes de futebol:

Sport Lisboa e Benfica

Futebol Clube do Porto

Sporting Club de Portugal

No caso do Benfica, a águia é, desde logo, um dos timbres mais frequentes na Heráldica de Família; o Sporting usa uma versão simplificada do brasão do Visconde de Alvalade, um dos seus fundadores; e o Porto, com o emblema mais heráldico de todos, usa como timbre o dragão tradicional das Armas Reais de Portugal, para além de ter o próprio "escudo das quinas" no primeiro e terceiro do esquartelado.

Para além destes três casos mais flagrantes, há que referir que muitos clubes desportivos foram buscar inspiração para os seus emblemas mais ou menos directamente na heráldica das localidades que representam.

A heráldica está igualmente presente em várias marcas de automóveis. Em alguns casos, como a Ferrari ou a Porsche, temos os verdadeiros brasões de família de Enzo Ferrari e Ferdinand Porsche, com um mínimo de estilização.

A Alfa Romeo exibe, num círculo, as armas de....

Emblema da Alfa Romeo

Noutros casos, porém, só uns olhos experimentados reconhecerão os brasões que deram origem aos símbolos das marcas...

O símbolo da Citröen é uma estilização das duas asnas do brasão do fundador da marca, o francês Louis Citröen.

O leão da Peugeot, por sua vez, vem directamente - embora muito estilizado - das armas municipais do Franche-Comté, um dos departamentos da França.

Referimos estes exemplos, ainda que não respeitem à heráldica portuguesa, porque nos cruzamos com eles todos os dias, sem provavelmente termos consciência das raízes heráldicas dos emblemas...

A Heráldica Corporativa também está activa, particularmente no meio universitário.

A Heráldica Militar merece uma referência especial, porque é nesta área que têm sido criados os melhores brasões portugueses da actualidade: para além de excelentes desenhadores, as Forças Armadas Portuguesas têm heraldistas da mais alta qualidade, e o rigor dos brasões e ordenamentos heráldicos criados nesta área devia servir de exemplo para todos.

Por outro lado, os estudos heráldicos são cada vez mais aprofundados e profissionais. Reconhecida como ciência auxiliar da História, a Heráldica tem lugar nas Universidades e deixou de ser uma mania de curiosos ou antiquários. Aparecem regularmente nas livrarias obras de altíssima qualidade gráfica e rigor heráldico, bem como novas revistas e publicações especializadas; realizam-se colóquios e conferências sobre temas relacionados de alguma forma com a Heráldica; o desenho heráldico atingiu porventura o nível de maior rigor e qualidade de sempre; e até este novo e formidável repositório de conhecimentos que é a Internet está povoada por dezenas de "sites" sobre Heráldica, de que o presente não é mais do que um modesto exemplo.

Indiscutivelmente, a Heráldica está viva e de boa saúde. Basta estarmos atentos ao que nos rodeia: existe Heráldica por toda a parte.