O elmo era uma das partes mais importantes da armadura dos cavaleiros medievais, uma vez que protegia a cabeça de golpes e pancadas que frequentemente poderiam ser fatais. Ainda hoje, os capacetes dos motociclistas e pilotos em geral exercem uma função idêntica à dos elmos...

Mas o elmo tem uma importância especial para a heráldica, uma vez que esteve entre as suas causas fundamentais. De facto, foi a difusão do uso de elmos fechados, impedindo o reconhecimento rápido de quem estava dentro da armadura, que forçou à utilização de símbolos e cores identificadores nos escudos e, em última análise, levou à criação de um sistema organizado e codificado de emblemas individuais – a Heráldica.

Capacete da
Idade do Bronze

Reprodução de um
capacete romano

Reprodução de um
capacete grego


Sabe-se que os guerreiros usaram capacetes ou alguma forma de protecção para a cabeça desde a Idade do Bronze, e gregos e romanos fizeram desses capacetes a parte mais importante e vistosa do seu equipamento. Mas só no século XII a evolução das artes da guerra e da tecnologia militar levou à necessidade da utilização de elmos fechados, como protecção contra as flechas dos archeiros, cada vez mais eficazes, e também contra os golpes das espadas, machados e maças de armas.

Reprodução de um elmo fechado do século XII

Alguns tipos de elmos, mostrando a sua evolução em linhas gerais

A forma dos elmos registou diversas evoluções e alterações, desde os mais antigos, quase cilíndricos, apenas com uma fresta para os olhos, até aos elmos de parada dos séculos XVIII e XIX, profusamente decorados e já meramente ornamentais. O elmo heráldico clássico, porém, é o elmo de torneio, de viseira articulada, aberta ou com grades, característico dos séculos XV-XVI.

Elmo de torneio, dito
"de boca de sapo" (c. 1480)

Elmo cerimonial, com
viseira de grades (1558)

Elmo de torneio, de
viseira aberta (c. 1510)


São estes os três tipos de elmos mais representados em Heráldica
e as suas correspondentes estilizações

Os elmos foram, na verdade, fundamentais nos torneios e justas, e isto condicionou em certa medida a sua própria evolução (bem como a das armaduras). A violência do embate entre dois cavaleiros que procuravam derrubar-se mutuamente com as lanças levou ao desenvolvimento dos elmos, os quais se prolongaram até proteger totalmente o pescoço e descendo para os ombros de forma a poderem fixar-se solidamente no tronco da armadura. É esta a origem da forma mais divulgada do elmo heráldico. Por outro lado, quando os torneios deixaram de se disputar com lanças e passaram a consistir apenas num combate com maças de armas, o elmo deixou de precisar de ser tão fechado na face e surgiram as viseiras de grades, cuja representação heráldica, em certos países, é exclusiva da nobreza.

Foram ainda os torneios que difundiram a utilização de figuras sobre os elmos, como forma de facilitar o reconhecimento da identidade do cavaleiro e aumentar a sua visibilidade pelos espectadores. Estas figuras eram, normalmente, uma das peças pintadas no escudo, e originaram os timbres no desenho heráldico. A sua riqueza decorativa é inegável, mas muitos brasões ostentam timbres que seria fisicamente impossível colocar sobre um elmo, ou que nenhum cavaleiro conseguiria equilibrar na cabeça...

Timbres dos Sousas e dos Pereiras, no "Livro da Nobreza e Perfeiçam das Armas",
de António Godinho (1516-1528)

Em rigor, o elmo heráldico deve ter de altura a mesma medida que a largura do escudo, e o timbre a mesma altura do elmo; mas raramente se encontram desenhados com tal precisão. Os timbres, particularmente, assumem frequentemente proporções excessivas.

Proporções ideais do elmo e timbre

Na heráldica portuguesa, o elmo é o principal distintivo da nobreza, papel ocupado noutros países pela coroa. O elmo pode constituir uma peça móvel do brasão, caso em que é normalmente representado cerrado e de perfil, devendo indicar-se, ao brasonar, o seu número, esmalte e posição; mas a função essencial do elmo na heráldica é figurar como ornato exterior do escudo, colocado sobre o seu bordo superior.

Quando o elmo tem a viseira levantada, diz-se aberto e é colocado a três quartos; com a viseira descida chama-se cerrado e põe-se de perfil.

Diz-se guarnecido de outro esmalte o elmo que tem na viseira e no seu bordo inferior uma virola ou filete desse esmalte.

Elmo guarnecido de ouro

Para a nobreza, o elmo deve ser de prata. O elmo de ouro deve ser posto de frente e o seu uso compete apenas aos reis, príncipes de sangue real e duques soberanos. Embora em alguns casos surjam elmos postos de frente em brasões de nobres titulares, tal prática não deve ser aceite. Alguns autores, contudo, não reconhecem valor histórico às distinções nos elmos. Note-se que Jean du Cros, no Livro do Armeiro-Mor (c. 1509), empregou elmos de prata e de ouro sem um critério aparente (tal como, de resto, o fez depois António Godinho no Livro da Nobreza e Perfeiçam das Armas); mas a regra heráldica, comum a diversos países, é a da exclusividade do uso de elmo de ouro pelo Rei.

Armas de D. Manuel I no Livro do Armeiro Mor (c. 1509)

Armas de D. Manuel  no Livro do Armeiro-Mor (c. 1509).
Note-se que o elmo, que, correctamente, é de ouro e coroado, deveria estar de frente...

Assim, na armaria portuguesa, o elmo é quase sempre de prata, aberto, guarnecido de ouro. Era esta a regra para os nobres de mais de três gerações; os recém-nobilitados, até à terceira geração, usavam elmo de prata, cerrado, guarnecido de ouro. Note-se que raramente esta regra era cumprida, particularmente pelos recém-nobilitados...

O elmo pode ser coroado, quer pela coroa real, quer por coronéis de titulares; mas este uso é raro na heráldica portuguesa.

A posição normal do elmo é assente sobre o topo do escudo, virado a três quartos para a direita do mesmo. O elmo de frente, como vimos, é exclusivo do Rei; o elmo voltado para a esquerda indica normalmente bastardia (ainda que alguns autores questionem esta regra), mas é de uso raríssimo. Igualmente rara hoje em dia, mas possível, é a representação do elmo de perfil.

Quando o escudo estiver colocado “ao ballon”, ou seja, inclinado para a direita (como no exemplo acima das armas de D. Manuel no Livro do Armeiro-Mor), o elmo deve manter-se vertical e assentar sobre o canto esquerdo do escudo, aquele que fica superior. O que nunca deve acontecer, em termos de desenho heráldico, é o elmo ficar suspenso no ar, “flutuando” sobre o escudo.

A heráldica francesa estabeleceu regras pormenorizadas para o desenho dos elmos, atribuindo significados específicos à cor do forro, ao número de grades da viseira e outras minúcias (ver, p. ex., Le Blason, pg. 120); mas tais regras não são observadas em Portugal.

Devemos recordar duas excepções ao uso do elmo:

  • Não se coloca elmo sobre o brasão de senhoras, o qual deve ser em lisonja, como foi dito a propósito das formas do escudo; em vez do elmo, pode colocar-se uma coroa, no caso de titulares, ou um simples laço.
  • Também não se coloca elmo sobre as armas de eclesiásticos, ainda que na Idade Média muitos bispos e abades combatessem com o mesmo ardor dos mais bravos guerreiros... Nestes casos, o brasão deve ser encimado por um chapéu de eclesiástico, cujo número de borlas indica o grau do armigerado na hierarquia da Igreja, como veremos ao falar da Heráldica Eclesiástica.

Finalmente, refira-se que o desenho do elmo é completado pelo virol, pelo paquife e pelo timbre.